Caminhões fazem fila para reabastecer em um posto de gasolina em Tarija, Bolívia, em 19 de outubro de 2025 – AFP
Confrontado com uma crise energética que tem provocado longas filas em postos e afetado o transporte e a produção em todo o país, o presidente boliviano, Luis Arce, sancionou a “Lei Excepcional e Transitória de Curta Duração para Garantir o Abastecimento de Diesel e Gasolina em Situações de Emergência”. A medida, anunciada na última segunda-feira (27 de outubro de 2025) por meio das redes sociais do próprio presidente, visa aliviar a escassez crônica de combustíveis, em um movimento que representa uma flexibilização temporária do monopólio estatal sobre a importação.
A nova legislação permite que o setor privado, sob estrito controle estatal, realize a importação direta de diesel e gasolina por um período de três meses, garantindo o suprimento em momentos de crise. A lei foi uma iniciativa impulsionada por setores produtivos e parlamentares, sobretudo da região de Santa Cruz, o motor econômico do país, que tem sido duramente atingida pela falta de suprimentos.
O Contexto da Crise e o Desafio do Subsídio
A escassez de combustíveis na Bolívia não é um problema isolado, mas sim um sintoma da grave crise econômica e da falta de dólares que o país enfrenta. Historicamente, a estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB) detém o monopólio da importação e comercialização, vendendo os derivados de petróleo com preços altamente subsidiados no mercado interno.
No entanto, com a queda acentuada das reservas internacionais e a dificuldade em obter moeda americana (dólares) para pagar fornecedores internacionais, a YPFB tem lutado para suprir a demanda nacional. A crise de divisas, que se arrasta por meses, levou o governo a vender reservas de ouro para tentar manter a capacidade de importação e o custoso sistema de subsídios, que custa bilhões de dólares anualmente (com uma estimativa de mais de $2 bilhões orçados para 2025).
A escassez resultante tem gerado filas quilométricas, paralisações no transporte público e de carga, e um impacto direto no agronegócio, ameaçando a segurança alimentar e a economia boliviana. A Câmara Agrícola Oriental (CAO) e outros setores produtivos já haviam alertado para a iminência de uma crise alimentar e econômica caso o fornecimento não fosse normalizado.

O Alerta do Presidente sobre os Preços
Ao sancionar a lei, o presidente Luis Arce reconheceu a necessidade da medida emergencial, mas fez questão de expressar as ressalvas de seu governo sobre a mudança. Ele alertou a população que a livre importação e venda, mesmo que controlada e temporária, pode ter um impacto direto e negativo nos preços ao consumidor final.
A lógica é que o setor privado, ao importar combustíveis sem o subsídio estatal, tenderá a repassar o custo real do produto internacional ao mercado interno. Em um país acostumado a preços artificialmente baixos devido à política de subsídios, qualquer aumento pode gerar forte insatisfação social e inflação. A nova lei busca contornar a escassez imediata, mas traz à tona o debate estrutural sobre a sustentabilidade da política de subsídios no longo prazo, diante da incapacidade de a YPFB arcar com os custos de importação.
Detalhes da Regulamentação Excepcional
A “Lei Curta”, como tem sido chamada, é uma resposta direta à pressão social e econômica. Ela estabelece um regime temporário de flexibilização, permitindo que pessoas jurídicas ou físicas privadas obtenham uma Licença Excepcional de Importação e Despacho Direto (LEIDD) da Agência Nacional de Hidrocarbonetos (ANH) em um prazo máximo de 48 horas.
Entre as medidas excepcionais incluídas na lei, está a liberação temporária do pagamento do Imposto sobre Transferências (IT) e do Imposto ao Valor Agregado (IVA) para as importações realizadas sob este regime, uma tentativa de minimizar o aumento de custos e tornar a operação privada viável.
Com a Bolívia enfrentando sua pior crise econômica em décadas, a sanção desta lei representa um reconhecimento tácito da incapacidade do Estado, no momento atual, de gerenciar sozinho o abastecimento e um passo, ainda que emergencial, em direção a uma maior participação do setor privado na economia nacional.
Fonte : Álvaro Rosales Melgar Unitel.






